É preciso atacar as dinâmicas poluidoras que matam o rio de uma perspectiva processual. Foto:Marcos Santos |
Os indicadores de poluição da água do Rio Pinheiros
constituem-se em um dos mais graves problemas ambientais da capital paulista.
“O impacto de sua poluição causa repercussões graves na saúde pública, no
turismo, nos alagamentos, nos transportes, no esporte e lazer da população,
para citar os desdobramentos mais evidentes”, afirma o cientista social Ricardo
Raele. A partir dessa constatação, Raele desenvolveu, no programa de
Pós-graduação em Ecologia Aplicada Interunidades (Escola Superior
de Agricultura “Luiz de Queiroz”- ESALQ e Centro de Energia Nuclear na
Agricultura-CENA), um modelo conceitual para orientar um plano de gestão
ambiental do sistema sócio-ecológico que abrange o rio Pinheiros.
Com orientação de Silvia Maria Guerra Molina, professora do
Departamento de Genética (LGN) da ESALQ, o estudo foi proposto com objetivo de
sanar a deficiência na gestão dos recursos hídricos nas grandes cidades e a
carência de metodologias científicas para se lidar com a questão.
O projeto teve apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq) e foi realizado com a estruturação de um método
baseado na teoria de sistemas que possibilitou a descoberta das variáveis de
sustentabilidade do Rio Pinheiros a partir de uma abordagem hierárquica e
transdisciplinar. “Na sequência, entrevistamos 15 especialistas e os dados
foram lançados em um software que calculou o posicionamento das variáveis em um
modelo conceitual considerando as suas relações na forma de um mapa”, explica o
pesquisador.
A lista especialistas contou com pessoas de formações muito
diferentes. De funcionários públicos de empresas de energia, passando por
professores, políticos, consultores, jornalistas. “A diversidade dos especialistas
foi fundamental para o sucesso da pesquisa”. Foram consultados profissionais da
Companhia de Geração de Energia AES-Eletropaulo, Companhia de Tecnologia de
Saneamento Ambiental (Cetesb), Faculdade de Saúde Pública (FSP), imprensa
especializada, Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp),
Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SMA), Empresa Metropolitana
de Águas e Energia (EMAE), Companhia Paulista de Trens e Metrôs (CPTM),
Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), Departamento de Águas e Energia
Elétrica (DAEE), Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FIESP,
Associação Águas Claras do Rio Pinheiros. Os dados brutos foram tratados dando
origem a 65 variáveis operacionais, objetivas e de relevância para a
sustentabilidade do rio Pinheiros.
A partir das entrevistas, as variáveis mais citadas foram:
Esgoto sanitário lançado no rio; Rede de esgotos não conectada a ETEs;
Apropriação do rio pela população; Promover a visão sistêmica acerca do
problema; Desbalanço hídrico da capital (déficit); Poluentes surfactantes; e
Rede de drenagem levando poluição difusa. “Ao longo das entrevistas os
especialistas notaram que esforços vêm sendo empregados no sentido de diminuir
a carga de esgotos que é lançada no rio Todos concordaram com tal fato, mas
seria ainda mais interessante pensar em soluções de banheiro seco,
liofilização, biocompostagem, wetlands e outras soluções que estão fora do
paradigma sanitarista que herdamos do pós-guerra” comenta Ricardo Raele.
Sobre a geração do modelo conceitual, o autor da pesquisa
acredita que possa gerar uma discussão aprofundada sobre como poderiam ser
organização ações concretas para melhoria do Rio Pinheiros. “É preciso atacar
as dinâmicas poluidoras que matam o rio de uma perspectiva processual.
Gastam-se centenas de milhões de reais para despoluir o rio, mas será que
estamos atacando o problema certo? Não se pode despoluir o rio caso mantenhamos
os comportamentos sociais que o poluem. Não há como despoluir o rio se a
cultura dos descartáveis permanecer da maneira que está, a cultura sanitarista
que usa água limpa para receber o esgoto continuar etc. Para “limpar o rio”
deve-se modificar as dinâmicas poluidoras. É sobre as dinâmicas que precisamos
nos debruçar, atuar no rio sempre será remediar um problema. Isso exige
mudanças profundas na cultura e na tecnologia que envolve a vida das pessoas.
Nessa linha, o rio está longe de sair da triste marca da ‘classe IV’, ou seja,
um rio morto”, finaliza.
Assessoria de Comunicação - USP ESALQ
Caio Albuquerque - Jornalista - caioalbuquerque@usp.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário